O que significa trabalhar com afeto?

Afeta\
3 min readJul 20, 2021

Por Thaís Prado
Co-idealizadora da Rede Afeta\

Estamos aos poucos entendendo a importância em perguntar como as pessoas estão, mas a verdade é que ainda não estamos prontos para ouvir a resposta.

Não é novidade dizer que vivemos em um mercado competitivo e que no meio de toda essa competição há muita pressa em resultado e muito atropelamento das individualidades e dos potenciais das pessoas. Falta confiança e falta liberdade. As empresas agem como pais autoritários e as pessoas funcionárias reagem com um dos dois comportamentos: o da submissão à vontade dos pais ou o da rebeldia. E no fim, quem escolhe o caminho da submissão faz o que é mandado sem questionar e sem promover nenhuma mudança e o que se rebela vai traçar seu próprio caminho, longe dos pais.

Confiança é algo que se constrói, não é dado. Quanto menos você confia nas pessoas que trabalham com você e reconhece a potência nelas, menos elas irão acreditar que são merecedoras dessa confiança. Esse é um ambiente de escassez onde ninguém deveria querer estar, muito menos promover. É o que se vê com o aumento do trabalho remoto, que acabou trazendo muito desse sentimento para perto das pessoas, a falta de contato e consequentemente, a falta da sensação de controle, desandou bastante o senso de confiança nessas relações de trabalho.

Falamos muito sobre o design centrado no humano e sobre trazer as pessoas para o centro das conversas e dos processos criativos, mas o que não paramos pra pensar é no COMO fazemos isso.

Sim, as ferramentas, as metodologias são importantes — com aqueles nomes novos que chamam atenção, que provocam um senso de inovação, que brilham os olhos. Cada dia um novo método mais ágil, mais objetivo, mais dinâmico, que traz mais resultado. Dentro dessas metodologias, fala-se muito sobre co-criação, mas muito pouco sobre o como trazer essas pessoas para dentro desses projetos, sobre como é feita essa troca. Facilitadores buscam potencializar o melhor de cada um, mas de novo eu pergunto, como?

É aí que entra o afeto.

As relações humanas são todas pautadas e atravessadas por afetos. Pensar afetos é pensar que essas manifestações afetivas do corpo, desde medo até a paixão, são algo orgânico e inerente ao ser humano. O afeto é a cola essencial para qualquer metodologia colaborativa, para qualquer relação que envolva troca, aprendizado e criatividade.

Mas como traduzimos o afeto no dia a dia?

Nós todes estamos aprendendo a relevância em fazer as perguntas certas, mas para trabalhar com afeto, mais do que certas, essas perguntas precisam ser empáticas, horizontais e inclusivas. E muitas vezes, mais importante ainda do que a pergunta que fazemos, é a nossa capacidade de escuta. É o quanto estamos preparades para ouvir as respostas da forma que elas vierem.

“Ouvir é um ato de autorização ao falante”

Grada Kilomba; A Máscara

Qualquer trabalho com e para pessoas parte do reconhecimento desses afetos e da intenção de criar um ambiente seguro para essas manifestações. Criar um ambiente seguro para que as trocas fluam é conseguir escutar e acolher cada um, cada realidade, cada ideia, cada opinião, cada sentimento. Quando criamos esse espaço e conseguimos isso, ampliamos a potência de qualquer processo criativo, porque não estamos mais apenas conduzindo uma co-criação, estamos colaborando de verdade.

A colaboração fala sobre um senso de pertencimento. É esse o ambiente que acreditamos promover não apenas mais inovação, mas também o fortalecimento das relações entre as pessoas e um senso de empoderamento sobre o próprio trabalho, aprendizado e sobre a própria voz. Ela fala sobre a nossa responsabilidade não só com o processo, mas com o outro que está ali com a gente.

O afeto traz de volta a ideia de unidade, de união, que perdemos cada vez mais mergulhados no nosso ego, na nossa individualidade e na competitividade. Não só não estamos sozinhos, como estamos o tempo todo, conscientes disso ou não, construindo algo juntes.

E é essa a troca essencial e a mentalidade de abundância que move a gente na Rede Afeta.

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